O recém-nascido: primeiras adaptações
O que aprendemos antes de nascer?
Annie Murphy Paul - repórter científica
- relata as mais recentes investigações que evidenciam os processos de aprendizagem
que os seres humanos desenvolvem mesmo antes de nascerem, desde as origens da
nossa linguagem, aquelas que serão as nossas comidas preferidas.
Com base nos seguintes tópicos, tentaremos transmitir a nossa opinião sobre este tema.
- Como a saúde e o bem-estar ao longo da vida podem ser determinados pelos nove meses que
passamos no ventre materno;
- Aprendizagem da língua materna;
- Memória;
- Relação entre subnutrição durante a gestação e o desenvolvimento de doenças;
- Suscetibilidade para desenvolver Síndromes de Stress Pós-Traumático;
Antes de mais, importa falar de "Origens Fetais", uma disciplina científica que surgiu há menos de trinta anos, e que se baseia na teoria de que a saúde e o bem-estar ao longo da nossa vida é fundamentalmente afetado pelos nove meses que passamos no ventre materno.

Então, quando começa a aprendizagem? Uma questão que pode ter múltiplas respostas, mas apenas uma verdadeiramente acertada;
Ao contrário do que o senso comum possa induzir, pesquisas nas áreas da Psicologia e Biologia indicam que a aprendizagem se inicia meses antes do nascimento, ainda dentro do ventre materno, imediatamente no período gestacional.
No quarto mês de gestação, com a formação e pleno crescimento dos principais órgãos, é ultrapassado o período critico, e o embrião passa a ser denominado de feto.
Primeiramente o feto começa a ouvir a voz da mãe e o som ambiente característicos do seu dia a dia, associando esses sons à proteção, ao cuidado e à tranquilidade. De facto, os sons ouvidos durante a gravidez (voz da mãe, músicas, livros, etc.) em tudo influenciam o bem-estar do bebé, inclusivamente o seu choro já será a imitar os contornos melódicos da língua nativa da mãe, que será também um bom começo na dura tarefa de compreender e aprender a sua língua.
Aos sete meses de gestação, as papilas gustativas e os recetores de olfato estão totalmente desenvolvidos, e assim aprendem sabores e cheiros, como o sabor dos alimentos que a mãe ingere, aprendendo o que devem, o bom e o que é seguro comer. Com isto, mesmo antes de nascerem, começam já a absorver da cultura especifica que irão integrar, através de uma das maiores manifestações culturais, que é a comida.
Durante a gravidez, o ar que a mãe respira, a comida e bebida, os químicos a que está exposta, mesmo as emoções que sente, são partilhadas de certa forma com o feto.
Sabendo disto, podemos pensar em métodos para tentar melhorar o desenvolvimento do feto, como por exemplo ouvir Mozart, no entanto, é de extrema importância que não hajam "manipulações" e que esses "cartões de visita" sejam aqueles que o bebé irá encontrar no mundo exterior.
A dieta e o nível de stress (emoções) da mãe enquanto grávida são cruciais e influenciam diretamente o seu desenvolvimento e sobrevivência. Abundância ou escassez? Segurança e proteção ou perigo e ameaça constante? Vida longa e próspera ou vida curta e atormentada?
Durante a gestação o feto adapta-se a todas as condicionantes impostas pela progenitora, pelo que o seu metabolismo e fisiologia geral será em função dessas conjunturas. Por exemplo, uma gravidez hipocalórica e com défice nutricional, acarretará consequências no imediato para o bebé, bem como no futuro da pessoa, enquanto que uma gestação em condições normais, levará a uma menor taxa de complicações.
Uma explicação para o surgimento destes problemas associados a uma dieta pobre em calorias, será que o feto fará a gestão desses nutrientes (limitados), encaminhando-os primeiramente para o principal órgão, o cérebro, ficando os restantes órgãos (como o coração e fígado) desnutridos, tornando-os suscetíveis a doenças. Nados-mortos, deficiências, baixo peso e mortalidade infantil, obesidade, tensão arterial mais elevada, perfis de colesterol mais pobres e reduzida tolerância à glucose, diabetes e doenças cardíacas são o cardápio de problemas associados à desnutrição gestacional.

Relativamente à subnutrição e aparecimento de doenças, o grande problema dá-se quando o "cartão de vista" não coincide com o estilo de vida, ou seja, o feto desenvolveu-se e preparou-se para algo que na realidade, posteriormente, será excessivo ou escasso, atendendo às suas necessidades.
Por isso a importância do ambiente gestacional ser idêntico ao ambiente exterior:
"O mundo sobre o qual tinham aprendido no útero não era o mesmo que o mundo no qual tinham nascido."
O mesmo ocorre com as emoções!
Uma grávida sujeita a stress constante ou a uma experiência difícil e marcante, pode levar ao desenvolvimento do Síndrome do Stress Pós-Traumático, no feto. No entanto, esta SSPT pode ser encarado como uma adaptação útil em certas circunstâncias, ou seja, haver uma hipersensibilidade sobre que se passa ao redor e manter o estado de alerta, pode de facto ser um aliado ao mundo atual.
Esta ligação na transmissão pré-natal de stress pós-traumático para o feto é ainda especulativa, no entanto é interessante ter a perspetiva de aviso dos perigos que existem, como um "tem cuidado!".
Salientemos também o prejuízo do uso/consumo simples ou abusivo de substâncias tóxicas por parte da mãe, sabendo que tudo seguirá naturalmente como fonte de alimentação para o feto.
É sabido que o alcoolismo pode provocar alterações morfológicas no feto, conhecidas como Síndrome Alcoólico Fetal, onde as características mais comuns são olhos pequenos, queixo projetado para dentro, orelhas mal implantadas, etc., podendo também afetar o crescimento do cérebro e dos órgãos, influenciando o modo como a criança pensa, age e aprende. O uso de drogas também! Malformações no sistema nervoso central, coração, aparelho digestivo e excretor são comuns em fetos sujeitos à presença destas substâncias. O tabagismo por sua vez está associado a riscos de aborto e parto prematuro, devendo-se principalmente à absorção do monóxido de carbono e à nicotina. Doenças como a bronquite, pneumonia, asma e infeções do ouvido médio são características comuns neste grupo de crianças.

Do mesmo modo, simples alimentos podem tornar-se "tóxicos" para o feto, como é o caso dos açucares, mais especificamente o chocolate, esse "pecado" tão desejado pelas gestantes. Trata-se de um alimento altamente calórico, com altas concentrações de gordura e hidratos, na grande maioria açucares, e quando consumido sem cuidados e em excesso durante a gravidez pode-se traduzir em sérios problemas como resistência à insulina e risco de diabetes gestacional, criando problemas tanto para a mãe, como para o feto, que é quem pretendemos demarcar.
Em suma, todo o período gestacional serve para aprender, para adaptar, e criar memórias úteis para o início de uma vida, tanto para o bem como para o mal!
"A aprendizagem é uma das atividades mais essenciais da vida, e começa muito mais cedo do que alguma vez imaginámos!"
Assim, para melhor promoção da saúde e do bem-estar da próxima geração, será importante que esse esforço seja incluído nos nove meses que passam no ventre materno!